As dificuldades escolares são
diversas e multifatoriais, dificultando, muitas vezes, delimitações mais
precisas. No entanto, o comprometimento de habilidades estratégicas para o
aprendizado, como atenção e leitura, pode determinar prejuízos persistentes e difusos,
justificando uma avaliação mais sistemática e aprofundada destas funções. O
avanço no conhecimento sobre transtornos como o TDAH e a Dislexia tem melhorado
a compreensão geral sobre estas funções, orientando ainda estratégias mais
específicas e eficazes de intervenção.
A atenção é a porta de entrada da
informação, devendo selecionar o que é relevante e controlar seu processamento
pelo cérebro. Entre outros efeitos, a atenção facilita a percepção, a memória e
a resposta motora, tendo papel central no aprendizado (seja uma habilidade ou
um conteúdo).
A leitura, ao contrário da fala, não
é aprendida de forma natural ou intuitiva. Esse processo pode ser favorecido
por um trabalho sequencial das habilidades envolvidas. A leitura tem como
finalidade a compreensão, e depende da decodificação (conversão de letras em
sons) adequada, além do domínio da língua (habilidades da linguagem oral).
Presumida a sua aquisição, a linguagem escrita se torna a principal (quase
exclusiva) ferramenta de acesso e avaliação dos conteúdos escolares, o que é
potencialmente problemático. Separar as demandas de leitura/escrita daquelas
próprias da disciplina pode ajudar a delimitar eventuais déficits, além de
enriquecer o aprendizado de todos os alunos.
O Transtorno do Déficit de Atenção e
Hiperatividade (TDAH) é definido pela presença de sintomas primários e
persistentes de desatenção, hiperatividade e impulsividade em níveis
disfuncionais. Dificuldades de organização e planejamento (disfunção executiva)
são também muito frequentes. A dislexia é um transtorno específico da
aprendizagem no qual há uma dificuldade significativa e persistente na leitura,
resultante de um déficit na decodificação. A compreensão da linguagem oral
encontra-se preservada, diferente do que é observado nas dificuldades primárias
de compreensão.
O TDAH e a dislexia são condições
prevalentes na infância (acometem cerca de 5% das crianças), com impactos na
vida escolar, social e familiar. A possibilidade de diagnósticos adicionais
(comorbidades) é a regra – não a exceção – nestes quadros, devendo ser
investigados (sintomas de outros transtornos do neurodesenvolvimento,
alterações do humor, ansiedade, entre outros). A taxa de comorbidade entre TDAH
e Dislexia é elevada e bidirecional (25 a 40% apresentam sintomas do outro
transtorno, independente do inicial). Esta associação, muito estudada, envolve
complexos mecanismos que são compartilhados por estes transtornos (genéticos,
ambientais, comportamentais, cognitivos, etc.). Situações comórbidas evoluem,
em geral, com maiores prejuízos, não só acadêmicos como globais (índices de
reprovação e evasão escolar, baixa autoestima, problemas de comportamento,
etc.). Ambos os transtornos devem ser diagnosticados e tratados. O
reconhecimento desta associação é uma tarefa muitas vezes difícil, e requer a
avaliação cuidadosa e a colaboração de todos os envolvidos.
Atenção e leitura são habilidades
múltiplas e complexas, que variam muito entre as pessoas (são dimensionais).
Avaliar adequadamente e entender os diversos perfis de funcionamento são
grandes desafios para as Neurociências. A dificuldade de leitura na comorbidade
parece se relacionar mais com a desatenção do que com os outros sintomas do
TDAH. Em algumas crianças, a impulsividade favorece muito o uso da adivinhação
como estratégia compensatória. Caso o comportamento de desatenção esteja
presente somente nos momentos de leitura, o diagnóstico de TDAH se torna mais
improvável. O papel da atenção visual na dislexia é foco recente de pesquisas,
além de outros parâmetros já identificados (velocidade de processamento,
memória operacional, etc.).
Estratégias de identificação
precoce, prevenção e intervenção têm sido desenhadas a partir deste
conhecimento, abrindo interessantes perspectivas. No entanto, há limitações
para a generalização destes resultados, que devem estar claras (diferenças
entre as línguas, variações culturais, etc.). A transparência é a marca da boa
ciência. Um olhar individualizado e bom senso são imprescindíveis em todos os
casos. Seguem algumas estratégias gerais em função dos aspectos sinalizados.
HABILIDADES IMPORTANTES PARA A
LEITURA
→ Consciência fonológica: capacidade
de perceber e manipular sons da fala
- reconhecer os sons das palavras
(usar palmas);
- fazer rimas, acrescentar e retirar
partes das palavras, formando outras.
→ Nomeação de letras e associação
letra-som
- usar jogos ou músicas para
facilitar a memorização;
- usar letra bastão, evitando
informações conflitantes antes da consolidação desta fase (letra cursiva);
- evitar exposição a uma segunda
língua quando houver dificuldade.
→Decodificação fluente (conversão
letra-som)
- começar com palavras simples e
regulares;
- aumentar progressivamente a
complexidade (palavras maiores, irregulares, frases curtas, etc.)
→ Domínio da língua (aspectos
estruturais e semânticos) e narrativa oral
- vocabulário (sentido literal e
figurado); palavras derivadas;
- estrutura frasal e relação entre
as frases;
- pistas do contexto e inferências;
- ideia central (personagens e fatos
principais);
- sequência temporal e os termos
indicativos;
- informações implícitas (o que o
personagem pensou ou sentiu; o que poderia ser diferente).
ACOMODAÇÕES DE LEITURA NA ESCOLA
→ A dislexia é uma dificuldade
persistente de leitura, que é sempre mais difícil e cansativa. Embora o
desempenho melhore com a prática, as demandas escolares crescentes (textos e
enunciados mais extensos e complexos em várias disciplinas) podem manter
eventuais lacunas. Além disso, a leitura deve ser estimulada como atividade de
prazer, praticada também fora da escola. Para isso, é fundamental possibilitar
outras formas de aprendizado, evitando possíveis sobrecargas.
ESTRATÉGIAS GERAIS:
→dar mais tempo para o aluno nas
atividades que envolvem leitura;
→aumentar o espaço entre as letras e
destacar as partes mais importantes (atenção visual);
→possibilitar leitura em voz alta
dos textos e enunciados quando necessário;
→ esclarecer as dúvidas sobre
textos/enunciados (antes de presumir falhas de conteúdo);
→ erros ortográficos atípicos fazem
parte do quadro e não devem ser descontados;
→ usar recursos visuais para
apresentar ou resumir os conteúdos (desenhos, figuras ou esquemas);
→ permitir que o aluno responda
oralmente ou através de recursos visuais;
→ atividades alternativas de
aprendizado (museus, exposições, filmes, etc.);
→ permitir a gravação das aulas e/ou
indicação material audiovisual sobre o conteúdo*
Fonte: TDHA