terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Erasmo de Roterdã - O porta-voz do humanismo

Holandês anunciou o fim da predominância religiosa na educação, defendeu a importância da leitura dos clássicos e o desenvolvimento do homem em todo o seu potencial.

Biografia
Geert Geertz – que depois adotaria o nome literário de Erasmo – nasceu em 1469 em Roterdã, Holanda. Era filho ilegítimo de um padre e também se ordenou monge. Aos 26 anos, foi a Paris para se doutorar e hospedou-se entre os frades do Colégio Montaigu, mas não suportou o regime de austeridade. Isso o levou a procurar sustento dando aulas e organizando compêndios de provérbios latinos. Em 1499 foi para a Inglaterra, onde fez amizade com intelectuais como Thomas More. Na casa dele, escreveria sua obraprima, O Elogio da Loucura. Convites de nobres e atividades acadêmicas levaram Erasmo a viajar pela Europa até o fim da vida. Acusado de inspirar Martinho Lutero a se rebelar contra a Igreja, Erasmo se viu obrigado a entrar em polêmica pública com o religioso alemão. O episódio se desdobrou em outras disputas teológicas até sua morte, em 1536, em Basiléia, na Suíça. A obra mais importante de Erasmo sobre educação é Civilidade Pueril.
Embora fosse clérigo e profundamente cristão, o filósofo holandês Erasmo de Roterdã (1469-1536) passou para a história por se opor ao domínio da Igreja sobre a educação, a cultura e a ciência. A influência religiosa vigorou praticamente sem contestação durante toda a Idade Média no Ocidente e ainda no tempo de Erasmo era preciso ousadia para ir contra ela. De qualquer modo, ousadia individual fazia parte das atitudes que um número crescente de intelectuais começava a enaltecer no período de transição para a Idade Moderna, entre eles o filósofo holandês. O pensamento nascente defendia a liberação da criatividade e da vontade do ser humano, em oposição ao pensamento escolástico, segundo o qual todas as questões terrenas deviam subordinar-se à religião.
O antropocentrismo – o predomínio do humano sobre o transcendente – era o eixo dessa nova filosofia, que seria posteriormente conhecida sob o nome de humanismo. A palavra deriva da expressão latina studia humanitatis, que se referia ao aprendizado, nas universidades, de poética, retórica, história, ética e filosofia, entre outras disciplinas. Elas eram conhecidas como artes liberais, porque se acreditava que dariam ao ser humano instrumentos para exercer sua liberdade pessoal.

Influência continental
A mais típica cultura humanista se desenvolveu nas cidades do norte da Itália, mas o mesmo espírito irradiou-se por toda a Europa. Entre os não-italianos, Erasmo foi o representante mais influente desssa corrente de pensamento. "Ele era o intelectual mais respeitado e prestigiado de seu tempo e sempre esteve ligado aos círculos de poder europeus", diz Cézar de Alencar Arnaut de Toledo, professor da Universidade Estadual de Maringá.
A fonte original de todo humanismo foi a literatura clássica. A época era de redescoberta e reinterpretação da produção cultural da antigüidade greco-romana. O interesse por esse período da história foi acompanhado por uma série de mudanças profundas na vida européia: a revitalização das cidades, a formação de redes de comércio entre centros distantes, a consolidação de uma classe mercantil muito abastada, a criação de bancos e a centralização do poder político em torno de cidades ou de reinos. Tudo isso ocasionou a abertura de brechas na autoridade da Igreja, antes onipresente. Por razões evidentes, esse período histórico de grandes transições ficou conhecido como Renascimento, dando origem a uma produção cultural das mais ricas e fecundas de todos os tempos (leia quadro abaixo).
Entrada da biblioteca Medicea-Laurenciana,
em Florença, na Itália, um símbolo renascentista:
tempo de valorização do livro.

A perfeição por meio do conhecimento
Erasmo criticava as escolas de seu tempo, em geral administradas por clérigos que baseavam sua pedagogia em manuais imutáveis, repetições de conceitos e princípios de disciplina com traços de sadismo. O filósofo via nos livros um imenso tesouro cultural, que deveria constituir a base do ensino. "Para Erasmo, a linguagem era o começo de toda boa educação, já que é sinal da razão humana", afirma Cézar de Toledo. Não se trata apenas de alfabetização e leitura, mas de interpretar os textos criticamente, prática que os humanistas e reformadores religiosos introduziram na história da pedagogia. Erasmo acreditava que um bom aprendizado das artes liberais até os 18 anos prepararia o jovem para entender qualquer coisa com facilidade. Como todo humanista, o pensador holandês defendia a possibilidade de chegar à perfeição por via do conhecimento. "Erasmo prenuncia novos rumos para a pedagogia ao deter um olhar mais acurado na infância", diz Toledo. Para o filósofo, ao ensinar era necessário levar em conta a pouca idade da criança – e por isso cercá-la de cuidados específicos – e também a índole de cada uma. O programa pedagógico do pensador era generoso, mas de modo algum democrático. Segundo ele, apenas a instrução religiosa deveria ser para todos, enquanto os estudos das artes liberais estariam restritos aos filhos da elite, que futuramente teriam cargos decisórios.
Erasmo se inseria no panorama cultural como um símbolo da nova era. Num tempo em que os papas insuflavam guerras e acumulavam fortunas e o clero dava fartas mostras de ostentação, hipocrisia e arrogância, Erasmo pregou a volta aos valores cristãos originais, a começar pela paz. Sua obra mais célebre, O Elogio da Loucura, é uma sátira à inversão de valores que detectava na sociedade de seu tempo. A moralidade estava no centro das preocupações do filósofo e deveria, de acordo com ele, ser a fonte e o objetivo final da educação.

História no centro do saber
As críticas de Erasmo ao clero, assim como seu interesse pelos estudos da linguagem, o aproximaram de Martinho Lutero (1483-1546), o monge alemão que deu origem ao protestantismo. Mas o filósofo holandês combatia a idéia de predestinação de Lutero por acreditar firmemente no livre-arbítrio dos seres humanos – todos são capazes de distinguir o bem e o mal, segundo ele. Além disso, sempre pregou o diálogo entre as facções discordantes no interior do cristianismo.
No campo propriamente pedagógico, o interesse de Erasmo pelo conhecimento das línguas antigas semeou o terreno para o estudo do passado, em particular do Novo Testamento e dos primeiros pensadores da fé cristã. A ênfase na história do homem e o estudo dos acontecimentos pretéritos ergueram um dos principais pilares da educação moderna. A cultura medieval, ao contrário, se construíra em torno do ideal de intemporalidade.
Detalhe de O Nascimento da Vênus,
do pintor italiano Sandro Botticelli:
tema da mitologia grega com
abordagem e alcance universais. 

Arte como Filosofia
Cultivo simultâneo do corpo e do espírito; procura da harmonia e do equilíbrio; elogio da vida ativa; busca do realismo, em todas as dimensões (incluindo as negativas e abjetas); e surgimento do conceito de dignidade do ser humano. Todos esses pilares humanistas, aliados aos investimentos materiais de comerciantes e nobres, deram às artes – mais especificamente à literatura e às artes plásticas – o ponto de convergência dos interesses do humanismo. A filosofia e a ciência ficaram, até certo ponto, em segundo plano, porque a obra artística passou a ser considerada manifestação filosófica. Em particular na Itália, a pintura e a escultura atingiram a perfeição pelas mãos de artistas como Sandro Botticelli, Rafael, Leonardo da Vinci e Michelangelo.
A então recente invenção da impressora de tipos móveis, pelo alemão Johannes Gutenberg, entusiasmava Erasmo com a promessa de ampla circulação de textos da literatura clássica. Ele via o conhecimento dos livros como alternativa saudável à educação religiosa que recebera. Segundo Erasmo, o ensino que havia conhecido "tentava ensinar humildade destruindo o espírito das crianças".
Outros valores renascentistas, como a exaltação da beleza e do prazer, se encontravam em profusão nos clássicos greco-romanos. Para Erasmo, esses princípios eram mais interessantes do que as abstrações da filosofia escolástica. Além disso, dizia ele, o prazer físico e o bom humor não conflitam com o cristianismo.
Apesar da notoriedade de que desfrutou em vida, Erasmo foi desprezado pelas gerações seguintes. Suas idéias seriam retomadas cerca de um século depois pelo educador tcheco João Comênio (1592-1670), considerado o pai da didática moderna.

Para pensar
Erasmo recuperou a noção de que um dos objetivos do ensino é levar às novas gerações o patrimônio da cultura humana contido nos livros. Costuma-se dizer que as crianças e os jovens não gostam de ler. Mas você já pensou que, quando os alunos se alfabetizam, eles ganham acesso a todo o conhecimento acumulado ao longo da história? Dizer que podem fazer uso disso como preferirem não seria um modo de estimulá-los a procurar os livros?

Quer saber mais?
Cézar de Alencar Arnaut de Toledo

BIBLIOGRAFIAErasmo da Cristandade, Roland H. Bainton, 385 págs., Ed. Calouste Gulbenkian
O Elogio da Loucura, Erasmo de Rotterdam, 223 págs., Ed. Martins Fontes

Tomás de Aquino - O pregador da razão e da prudência

Doutor da Igreja inverteu prioridades no pensamento medieval, dando ênfase ao mundo real e ao aprendizado pelo raciocínio

Biografia
Tomás de Aquino nasceu em 1224 ou 1225 perto da cidade de Aquino, no reino da Sicília (hoje parte da Itália). Sua família era proprietária de um pequeno feudo e ligada politicamente ao imperador Frederico II. Tomás foi encaminhado ainda criança para o monastério de Monte Cassino, com o objetivo de seguir carreira religiosa. Nove anos depois, devido a um conflito entre o imperador e o papa, ele foi tirado do monastério e enviado para a Universidade de Nápoles, onde entrou em contato com a obra de Aristóteles. Pouco depois, decidiu juntar-se à ordem mendicante dos frades dominicanos. Quando seus superiores o enviaram para a Universidade de Paris, os pais do noviço chegaram a seqüestrá-lo no caminho. Apesar de ter ficado um ano proibido de sair da propriedade da família, a vontade de Tomás prevaleceu e ele se mudou para Paris. O resto de sua vida se resumiu à atividade acadêmica, com uma interrupção de alguns anos para trabalhar como conselheiro da Cúria Papal, em Roma. Já perto do fim da vida, Tomás voltou à Universidade de Nápoles, para dar aula. Sua passagem pela Universidade de Paris foi marcada por polêmicas com outros pensadores. Morreu em 1274, na abadia de Fossanova (hoje centro da Itália). Foi canonizado em 1323 e nomeado "doutor da Igreja" em 1567.
Depois de oito séculos marcados por uma filosofia voltada para a resignação, a intuição e a revelação divina, a Idade Média cristã chegou a um ponto de tensão ideológica que levou à inversão quase total desses princípios. O personagem-chave da reviravolta foi São Tomás de Aquino (1224/5-1274), o grande nome da filosofia escolástica (leia quadro abaixo), cujo pensamento privilegiou a atividade, a razão e a vontade humana.

Numa época em que a Igreja ainda buscava em Santo Agostinho (354-430) e seus seguidores grande parte da sustentação doutrinária, Tomás de Aquino formulou um amplo sistema filosófico que conciliava a fé cristã com o pensamento do grego Aristóteles (384-322 a. C.) – algo que parecia impossível, até herético, para boa parte dos teólogos da época. Não se tratava apenas de adotar princípios opostos aos dos agostinianos – que se inspiravam no idealismo de Platão (427-347 a. C.) e não no realismo aristotélico – mas de trazer para dentro da Igreja um pensador que não concebia um Deus criador nem a vida após a morte.

A porção mais influente da obra de Aristóteles havia desaparecido das bibliotecas da Europa, embora tivesse sido preservada no Oriente Médio. Ela só começou a reaparecer no século 12, principalmente por meio de comentadores árabes, conquistando grande repercussão nos círculos intelectuais. As idéias de Aristóteles respondiam melhor aos novos tempos do que o neoplatonismo. Vivia-se o período final da Idade Média e a transição de uma sociedade agrária para um modo de produção mais orientado para as cidades e a atividade comercial. Avanços tecnológicos, principalmente relacionados aos instrumentos de trabalho, começavam a influir na vida das pessoas comuns e os trabalhadores urbanos se organizavam em corporações (guildas).

Valorização da matéria
Aristóteles, em sua obra, punha a razão e a investigação intelectual em primeiro plano. A realidade material era considerada a fonte primordial de conhecimento científico e mesmo de satisfação pessoal. "Tomás afirma que há no ser humano uma alma única, intrinsecamente unida ao corpo", diz Luiz Jean Lauand, professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. "Era uma idéia revolucionária para uma época marcada pelo espiritualismo de Santo Agostinho, que trazia consigo certo desprezo pela matéria."

Período exige abertura da igreja para o mundo
Reunião de acadêmicos na Universidade
de Paris, mostrada em gravura medieval:
discussões revolucionariam a ciência. 
Tomás de Aquino é uma figura simbólica de seu tempo na medida em que representou como ninguém a tensão entre a tradição cristã medieval e a cultura que se formava no interior de uma nova sociedade. Uma das respostas da Igreja a uma necessidade crescente de abertura para o mundo real foi a criação das ordens mendicantes, que, sem bens, vivem da caridade, ao mesmo tempo que se voltam para o socorro dos doentes e miseráveis. As duas ordens mendicantes surgidas na época foram a dos franciscanos, fundada por São Francisco de Assis (1181/2-1226), e a dos dominicanos, por São Domingos de Gusmão (1170-1221). Tomás de Aquino se filiou aos dominicanos. Outra característica dessa fase histórica foi o nascimento das universidades, que se tornaram o centro das discussões teológicofilosóficas, em particular na Universidade de Paris, onde o pensador estudou e lecionou. O ensino nessas instituições se assentava na divisão de disciplinas entre trívio e quadrívio, sistema que remonta à Antigüidade clássica. O quadrívio, que corresponderia às atuais ciências exatas, agrupava aritmética, geometria, astronomia e música, e o trívio, aparentado à idéia de ciências humanas, reunia a gramática, a retórica e a dialética. As discussões do período, no entanto, em breve levariam a um questionamento dos conceitos científicos vigentes.
Tomás de Aquino realizou um trabalho monumental numa vida relativamente curta. Sua obra mais importante, apesar de não concluída, é a Suma Teológica, na qual revê a teologia cristã sob a nova ótica, seguindo o princípio aristotélico de que cabe à razão ordenar e classificar o mundo para entendê-lo. Eis o princípio operacional do tomismo, como é chamada a filosofia inaugurada por Tomás de Aquino.

A relação entre razão e fé está no centro dos interesses do filósofo. Para ele, embora esteja subordinada à fé, a razão funciona por si mesma, segundo as próprias leis. Ou seja, o conhecimento não depende da fé nem da presença de uma verdade divina no interior do indivíduo, mas é um instrumento para se aproximar de Deus. "Segundo Tomás, a inteligência é uma potência espiritual", afirma Lauand.

Essência a desenvolver
De acordo com o filósofo, há dois tipos de conhecimento: o sensível, captado pelos sentidos, e o intelectivo, que se alcança pela razão. Pelo primeiro tipo, só se pode conhecer a realidade com a qual se tem contato direto. Pelo segundo, pode-se abstrair, agrupar, fazer relações e, finalmente, alcançar a essência das coisas, que é o objeto da ciência. O processo de abstração que vai da realidade concreta até a essência universal das coisas é um exemplo da dualidade entre ato e potência, princípio fundamental tanto para Aristóteles quanto para a filosofia escolástica.

Para extrair das coisas sua essência, é necessário transformar em ato algo que elas têm em potência. Disso se encarrega o que Tomás de Aquino chama de inteligência ativa – em complementação a uma inteligência passiva, com a qual cada um pode formar os próprios conceitos. A idéia, transportada para a educação, introduz um princípio pedagógico moderno e revolucionário para seu tempo: o de que o conhecimento é construído pelo estudante e não simplesmente transmitido pelo professor. "Tomás nos lega uma filosofia cuja característica principal é uma abertura para o conhecimento e para o aluno", diz Lauand.

Como o filósofo vê em todo ser a potência e o ato (apenas Deus está acima da dicotomia, sendo "ato puro"), a noção de transformação por meio do conhecimento é fundamental em sua teoria. Cada ser humano, segundo ele, tem uma essência particular, à espera de ser desenvolvida, e os instrumentos fundamentais para isso são a razão e a prudência – esse, para Tomás de Aquino, era o caminho da felicidade e também da conduta eticamente correta.

"A direção da vida é competência da pessoa e Tomás mostra que não há receitas para agir bem, porque a prudência versa sobre atos situados no aqui e agora", declara Lauand.

Cidades ganham importância e novas escolas
Com sua teoria do conhecimento, que "convoca" a vontade e a iniciativa de cada um na direção do aperfeiçoamento, São Tomás de Aquino legou à educação sobretudo a idéia de autodisciplina. Foi essa a marca do ensino cristão, que alcançaria sua máxima eficiência, em termos de doutrinação, com os jesuítas, já no século 16. Embora a obra de Tomás de Aquino apontasse para o auto-aprendizado, a idéia não foi abraçada pelas rígidas hierarquias da Igreja Católica. No período em que o filósofo viveu, a religião seguia sendo a principal fonte de instrução, como em toda a Idade Média. Sobreviviam as escolas monásticas em mosteiros afastados da cidade, que inicialmente visavam a formação de monges, mas depois também de leigos das classes proprietárias. Com o surgimento da economia mercantil nas cidades, aparecem também as escolas episcopais, urbanas, destinadas a formar o clero secular (aquele que participava da vida social) e leigos. A palavra latina schola ganhou, nessa época, o significado de centro de encontro e de estudos. Vem daí o adjetivo escolástico, relativo à filosofia da época.

Para pensar
Tomás de Aquino ressaltou o valor da razão humana e de conhecer como ela funciona, a começar pela importância de ordenar para entender. Já pensou nisso ao planejar suas aulas? Tente avaliar o interesse de ligar os conteúdos, mesmo aqueles mais abstratos (como os da Matemática), a experiências concretas anteriores. Isso é sempre possível e recomendável ou há exceções?

Quer saber mais?
Cultura e Educação na Idade Média, Luiz Jean Lauand (org.), 347 págs., Ed. Martins Fontes
Sobre o Ensino (De Magistro)/Os Sete Pecados Capitais, Tomás de Aquino, 160 págs., Ed. Martins Fontes
Tomás de Aquino – A Razão a Serviço da Fé, José Silveira da Costa, 128 págs., Ed. Moderna
Verdade e Conhecimento, Tomás de Aquino, 390 págs., Ed. Martins Fontes
No site http://www.jeanlauand.com/, você encontra artigos sobre filosofia medieval e Tomás de Aquino, além de notícias sobre estudos na área.

Santo Agostinho, o idealizador da revelação divina

Sábio cristão afirmava que o homem só tem acesso ao conhecimento quando iluminado por Deus.

Biografia

Aurelius Augustinus, que passaria para a história como Santo Agostinho, nasceu em 354, em Tagaste (hoje na Argélia), sob o domínio romano. Embora sua mãe fosse cristã, Agostinho não se interessou por religião quando jovem. Sentia-se atraído pela filosofia romana. Antes dos 20 anos já tinha um filho, de uma relação não formalizada. Em pouco tempo, abriu uma escola na sua cidade natal. Tornou-se professor de retórica, lecionando depois em Cartago, Roma e Milão. Nesta cidade, tomou contato com o neoplatonismo e, aos 32 anos, converteu-se ao cristianismo. De volta a Tagaste, decidido a observar a castidade e a austeridade, vendeu as propriedades que herdara dos pais e fundou uma comunidade monástica, onde pretendia se isolar. Mas, sem que planejasse, foi nomeado sacerdote da igreja de Hipona, função que manteve até a morte, em 430. Suas obras principais são Confissões, Cidade de Deus e Da Trindade.

Embora tenha vivido nos últimos anos da Idade Antiga – que se encerrou com a queda do Império Romano, no ano de 476 –, Santo Agostinho (354-430) foi o mais influente pensador ocidental dos primeiros séculos da Idade Média (476-1453). A ele se deveu a criação de uma filosofia que, pela primeira vez, deu suporte racional ao cristianismo. Com o pensamento de Santo Agostinho, a crença ganhou substância doutrinária para orientar a educação, numa época em que a cultura helenística (baseada no pensamento grego) havia entrado em decadência e a nova religião conquistava cada vez mais seguidores, mesmo se fundamentando quase que exclusivamente na fé e na difusão espontânea.

Outros pensadores já haviam se dedicado à revisão da cultura clássica (greco-romana) para adaptá-la aos novos tempos. Havia nisso algo de estratégico, já que o paganismo ainda continuava vivo na Europa e em regiões vizinhas. Era uma forma de mostrar aos indecisos que a conversão ao cristianismo não seria incompatível com maneiras de viver e de pensar a que estavam acostumados. Entre os pensadores gregos, o que mais se prestava à construção de uma filosofia cristã era Platão (427-347 a.C.), e a escola de pensamento hegemônica nos primeiros séculos da Idade Média ficou conhecida como neoplatonismo.
Ensino e catequese

À medida que a Igreja se tornava a instituição mais poderosa do Ocidente, a filosofia de Santo Agostinho definia a cultura de seu tempo. Educação e catequese praticamente se equivaliam – as escolas eram orientadas para a formação de membros do clero, ficando em segundo plano a transmissão dos conteúdos tradicionais. O conhecimento tinha lugar central na filosofia de Santo Agostinho, mas ele se confundia com a fé. Diante disso, a educação daquela época – conhecida como patrística, em referência aos padres que a ministravam – estimulava acima de tudo a obediência aos mestres, a resignação e a humildade diante do desconhecido. O objetivo era treinar o controle das paixões para merecer a salvação numa suposta vida após a morte.

O início da Era Cristã
Conversão de Constantino ao
cristianismo em pleno campo de batalha:
fé marca nova era. 
Santo Agostinho presenciou a decadência do Império Romano. No ano de 312, pouco mais de quatro décadas antes de seu nascimento, o imperador Constantino havia oficializado o cristianismo em toda a região sob seu domínio – que sofria ataques contínuos dos povos bárbaros. Um ano antes da morte de Agostinho, em 430, os vândalos haviam invadido sua região natal, na África. A queda do império romano aconteceria 36 anos depois da morte do filósofo, com a deposição do último monarca pelos germânicos. Os quase mil anos seguintes seriam englobados pelos historiadores no período da Idade Média, que tem entre suas características principais o domínio da Igreja Católica sobre quase todas as atividades humanas. A filosofia de Santo Agostinho domina a primeira fase da Idade Média (mais ou menos até o século 11), marcada por guerras constantes, decadência das cidades, pulverização do poder político e internacionalização da cultura por meio da Igreja. É uma época em que a educação é eminentemente religiosa e a ciência avança pouco e se difunde menos ainda.
Não é por acaso que a obra principal de Santo Agostinho seja Confissões, em que narra a própria conversão ao cristianismo depois de uma vida em pecado. Trata-se de uma trajetória de redefinição de si mesmo à luz de Deus, culminando com a redenção. O livro descreve a busca da salvação, ao mesmo tempo psicológica e filosófica. Tal procura se transformaria numa espécie de paradigma da vida terrena para os cristãos e vigoraria durante séculos como princípio confessional.

Toda a reflexão de Santo Agostinho parte da indagação sobre o conhecimento, introduzindo a razão, o pensamento e os sentidos humanos no debate teológico. Segundo o filósofo, os sentidos nunca se enganam e, portanto, o que eles captam é, para o ser humano, a verdade. Dizer que essa verdade constitui a verdade do mundo, no entanto, pode ser um erro.

Acesso ao eterno

O pensamento não se confunde com o mundo material – ele é simultaneamente a essência do ser humano e a fonte dos erros que podem afastá-lo da verdade. O conhecimento seria a capacidade de concluir verdades imutáveis por meio dos processos mentais. Um exemplo de verdade imutável seriam as regras matemáticas. Como o homem é inconstante e sujeito ao erro, uma verdade imutável não pode provir dele mesmo, mas de Deus, que é a própria perfeição. Assim, o ser humano tem pensamento autônomo e acesso à verdade eterna, mas depende, para isso, de iluminação divina.

Escola com disciplina militar
Missionários jesuítas entre índios
americanos: europeus catequizam os nativos.
 
Se Santo Agostinho foi a primeira grande força intelectual de uma era em que a Igreja de Roma exerceu o poder cultural máximo, a ordem dos jesuítas pode ser considerada a última. A Companhia de Jesus surgiu no início do século 16 na Espanha, criada por um militar, Inácio de Loyola (1491-1556), depois Santo Inácio. Representou, na educação, a linha de frente na guerra da Igreja contra a reforma protestante do alemão Martinho Lutero. Como os agostinianistas, os jesuítas valorizavam a disciplina e a obediência e promoviam o sacrifício da liberdade de pensamento em benefício do temor a Deus. Diferentemente de Santo Agostinho, porém, os jesuítas favoreciam a erudição e o elitismo. Integravam um movimento conservador, derrotado a partir do século 17, com a ascensão do racionalismo, na filosofia, e as revoltas contra o absolutismo, na política. Os jesuítas – criadores de métodos de ensino tradicionalistas mas muito eficientes – têm grande importância na história das colônias européias da América, entre elas o Brasil, porque construíram as primeiras estruturas educativas do continente.
Se o bem vem de Deus, o mal se origina da ausência do bem e só pode ser atribuído ao homem, por conduzir erroneamente as próprias vontades. Se o fizesse de modo correto, chegaria à iluminação. A ausência do bem se deve também a uma quase irresistível inclinação do ser humano para o pecado ao fazer prevalecer os impulsos do corpo, e não a alma.

Santo Agostinho tratou o tema da educação mais de perto em duas obras, De Doctrina Christiana e De Magistro, na qual apresenta a doutrina do mestre interior. A idéia é que o professor não ensina sozinho, mas depende também do aluno e, sobretudo, de uma verdade comum aos dois. Simplificando, o professor mostra o caminho e o aluno o adota; assim, o saber brota de seu interior. "A pessoa que ensina não transmite, mas desperta", diz Eliane Marta Teixeira Lopes, professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais. "Para Santo Agostinho, é desse modo que se conquista a paz da alma, e esse é o objetivo final da educação."

Para pensar
A filosofia de Santo Agostinho está condicionada à fé religiosa e, especificamente, à ética cristã. A educação moderna, no entanto, é laica, mesmo nas escolas administradas por organizações religiosas, porque a cultura ocidental evoluiu para a separação clara entre razão e fé. Mesmo assim, o pensamento agostiniano permite um diálogo interessante com concepções pedagógicas contemporâneas. Você já deve ter ouvido críticas às concepções de ensino segundo as quais o professor apenas transmite conhecimentos para um aluno passivo. Que semelhanças e diferenças percebe entre as correntes atuais que fazem essas críticas e o princípio agostiniano de que o mestre indica o caminho, mas só o aluno constrói (ou não) a informação?

Quer saber mais?
A Psicanálise Escuta a Educação, Eliane Marta Teixeira Lopes, 244 págs., Ed. Autêntica
Os Jesuítas e a Educação, Egidio Schmitz, 254 págs., Ed. Unisinos
Santo Agostinho, coleção Os Pensadores, 426 págs., Ed. Nova Cultural
Santo Agostinho, Marcos Roberto Nunes Costa, 216 págs., Ed. Edipucrs

REALISMO - ARISTÓTELES: O defensor da instrução para a virtude

O primeiro lógico via na escola o caminho para a vida pública e o exercício da ética
Biografia

Aristóteles nasceu em 384 a.C. em Estagira, na Macedônia (então sob influência grega e onde o grego era a língua predominante), filho de um médico. Aos 17 anos foi enviado à Academia de Platão, em Atenas, onde estudou e produziu filosofia durante 20 anos – parte de sua obra no período tem o objetivo de atacar a escola rival, de Isócrates, segundo a qual a finalidade do ensino era levar os alunos a dominar a retórica para serem capazes de defender qualquer ponto de vista, dependendo do interesse. Na Academia, a finalidade da educação era alcançar a sabedoria. Com a morte de Platão, em 347 a.C., Aristóteles mudou-se para Assos, na atual Turquia, possivelmente decepcionado por não ter sido escolhido para substituir o mestre na direção da Academia. Em 343 a.C., foi chamado por Felipe II, da Macedônia, para educar seu filho, Alexandre, e permaneceu na função durante vários anos, até que o pupilo começou a conquistar um vasto império (que incluía a Grécia, anexada por seu pai). De volta a Atenas, Aristóteles fundou a própria escola, o Liceu, desenvolvendo uma obra marcadamente antiplatônica. Depois da morte de Alexandre, Aristóteles passou a ser perseguido por ter colaborado na educação do imperador macedônio. Refugiou-se em Calcis, onde morreu em 322 a.C.
De todos os grandes pensadores da Grécia antiga, Aristóteles (384-322 a.C.) foi o que mais influenciou a civilização ocidental. Até hoje o modo de pensar e produzir conhecimento deve muito ao filósofo. Foi ele o fundador da ciência que ficaria conhecida como lógica e suas conclusões nessa área não tiveram contestação alguma até o século 17. Sua importância no campo da educação também é grande, mas de modo indireto. Poucos de seus textos específicos sobre o assunto chegaram a nossos dias. A contribuição de Aristóteles para o ensino está principalmente em escritos sobre outros temas.

As principais obras de onde se pode tirar informações pedagógicas são as que tratam de política e ética. "Em ambos os casos o objetivo final era obter a virtude", diz Carlota Boto, professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. "Em suas reflexões sobre ética, Aristóteles afirma que o propósito da vida humana é a obtenção do que ele chama de vida boa. Isso significava ao mesmo tempo vida ‘do bem’ e vida harmoniosa." Ou seja, para Aristóteles, ser feliz e ser útil à comunidade eram dois objetivos sobrepostos, e ambos estavam presentes na atividade pública. O melhor governo, dizia ele, seria "aquele em que cada um melhor encontra o que necessita para ser feliz".

Cultivo da perfeição

"A educação, para Aristóteles, é um caminho para a vida pública", prossegue Carlota. Cabe à educação a formação do caráter do aluno. Perseguir a virtude significaria, em todas as atitudes, buscar o "justo meio". A prudência e a sensatez se encontrariam no meio-termo, ou medida justa - "o que não é demais nem muito pouco", nas palavras do filósofo.
Um dos fundamentos do pensamento aristotélico é que todas as coisas têm uma finalidade. É isso que, segundo o filósofo, leva todos os seres vivos a se desenvolver de um estado de imperfeição (semente ou embrião) a outro de perfeição (correspondente ao estágio de maturidade e reprodução). Nem todos os seres conseguem ou têm oportunidade de cumprir o ciclo em sua plenitude, porém. Por ter potencialidades múltiplas, o ser humano só será feliz e dará sua melhor contribuição ao mundo se desfrutar das condições necessárias para desenvolver o talento. A organização social e política, em geral, e a educação, em particular, têm a responsabilidade de fornecer essas condições.

Imitação, o princípio do aprendizado

Aristóteles não era, como Platão, um crítico da sociedade e da democracia de Atenas. Ao contrário, considerava a família, como se constituía na época, o núcleo inicial da organização das cidades e a primeira instância da educação das crianças. Atribuía, no entanto, aos governantes e aos legisladores o dever de regular e vigiar o funcionamento das famílias para garantir que as crianças crescessem com saúde e obrigações cívicas. Por isso, o Estado deveria também ser o único responsável pelo ensino. Na escola, o princípio do aprendizado seria a imitação. Segundo ele, os bons hábitos se formavam nas crianças pelo exemplo dos adultos. Quanto ao conteúdo dos estudos, Aristóteles via com desconfiança o saber "útil", uma vez que cabia aos escravos exercer a maioria dos ofícios, considerados indignos dos homens livres.

Ninguém nasce virtuoso

A virtude, para Aristóteles, é uma prática e não um dado da natureza de cada um, tampouco o mero conhecimento do que é virtuoso, como para Platão (427-347 a.C.). Para ser praticada constantemente, a virtude precisa se tornar um hábito. Embora não se conheça nenhum estudo de Aristóteles sobre o assunto, é possível concluir que o hábito da virtude deve ser adquirido na escola.

Grande parte da obra que originou o legado aristotélico se desenvolveu em oposição à filosofia de Platão, seu mestre e fundador da Academia ateniense, que Aristóteles freqüentou durante duas décadas. Posteriormente, ele fundaria uma escola própria, o Liceu. Uma das duas grandes inovações do filósofo em relação ao antecessor foi negar a existência de um mundo supra-real, onde residiriam as idéias. Para Aristóteles, ao contrário, o mundo que percebemos é suficiente, e nele a perfeição está ao alcance de todos os homens. A oposição entre os dois filósofos gregos – ou entre a supremacia das idéias (idealismo) ou das coisas (realismo) - marcaria para sempre o pensamento ocidental.

A verdade científica

A segunda inovação de Aristóteles foi no campo da lógica. De acordo com o filósofo, determinar uma verdade comum a todos os componentes de um grupo de coisas é a condição para conceber um sistema teórico. Para a construção de tal conhecimento, Aristóteles não se satisfez com a dialética de Platão, segundo a qual o caminho para chegar à verdade era a depuração dos argumentos e pontos de vista por intermédio do diálogo.

Aristóteles quis criar um método mais seguro e desenvolveu o sistema que ficou conhecido como silogismo. Ele consiste de três proposições – duas premissas e uma conclusão que, para ser válida, decorre das duas anteriores necessariamente, sem que haja outra opção. Exemplo clássico de silogismo é o seguinte. Todos os homens são mortais. Sócrates é um homem. Portanto, Sócrates é mortal. Isso não basta, porém, para que a lógica se torne ciência. Um silogismo precisa partir de verdades, como as contidas nas duas proposições iniciais. Elas não se sujeitam a um raciocínio que as demonstre. Demonstram-se a si mesmas na realidade e são chamadas de axiomas. A observação empírica – isto é, a experiência do real – ganha, assim, papel central na concepção de ciência de Aristóteles, em contraste com o pensamento de Platão.

O início da Época Helenista

Aristóteles era um jovem estudante da Academia de Platão, em Atenas, quando, em 359 a.C., Felipe II, da Macedônia, interveio militarmente na Grécia. Uma tardia reação dos gregos foi sufocada quase 20 anos depois, com a vitória de Felipe na batalha de Queronéia – marcando o fim das cidades-estados na Grécia. Enquanto Aristóteles educava Alexandre, filho de Felipe, tentava incutir no aluno os ideais dos heróis de Homero e o dever de combater os povos considerados "bárbaros" (todos aqueles que não eram gregos nem haviam recebido influência grega). Embora Alexandre tenha mais tarde defendido a Grécia dos persas e Aristóteles tenha gozado até o fim da vida de apoio material dos governantes macedônios, o imperador não reteve muitos ensinamentos do mestre. Alexandre foi um tirano dedicado à conquista de territórios pelas armas, princípios opostos à autodeterminação democrática das cidades, defendida pelo filósofo. Com a Grécia incorporada ao império de Alexandre, Atenas perdeu importância como produtora de conhecimento, mas a cultura helenística ganhou centros de difusão fundados pelo imperador, como Alexandria, no Egito. Grande parte da extensa obra de Aristóteles se perdeu e o que restou foi reorganizado (e talvez deturpado) por pensadores de outras épocas. A obra aristotélica só voltou a circular na Europa na Idade Média, por intermédio dos invasores árabes, que haviam preservado seus livros.

Para pensar
Aristóteles acreditava que educar para a virtude era também um modo de educar para viver bem – e isso queria dizer, entre outras coisas, viver uma vida prazerosa. No mundo atual, nem sempre se vê compatibilidade entre a virtude e o prazer. Ainda assim, você acredita que seja possível desenvolver em seus alunos uma consciência ética e, ao mesmo tempo, a capacidade de apreciar as coisas boas da vida?

Quer saber mais?
A Política, Aristóteles, 352 págs., Ed. Martins Fontes
Aristóteles e a Educação, Antoine Hourdakis, 152 págs., Ed. Loyola
Ética a Nicômaco, Aristóteles, 320 págs., Ed. Edipro
Ética e Política em Aristóteles, Solange Vergnières, 304 págs., Ed. Paulus

Enxaqueca


A enxaqueca apresenta quatro fases distintas: pródromo, aura, cefaléia e resolução/pósdromo.

  • A fase da enxaqueca do pródromo, ou fase premonitória, consiste no período anterior a dor de cabeça, a cefaleia, podendo ser de dias precedendo a crise de enxaqueca. Mais de 50% dos pacientes apresentam sintomas de enxaqueca premonitórios como fadiga, bocejos, retenção de fluido, dor muscular, desejo para determinadas comidas (chocolates, carbohidratos), alteração de humor. Acredita-se que boa parte destes sintomas são mediados pelo sistema dopaminérgico, e que medicações antidopaminérgicas podem evitar a crise de enxaqueca. Diminuição da serotonina também ocorre na fase prodrômica.       
  • A aura enxaquecosa é definida por uma disfunção neurológica transitória originada no córtex cerebral (camada mais externa do cérebro) ou no tronco cerebral (base do cérebro, área de controle de funções vitais do organismo). A aura geralmente precede a crise de enxaqueca, mas também pode acompanhá-la. Em raras ocasiões, pacientes podem apresentar auras sem cefaléia. A Aura é na maioria das vezes visual, ou seja, pontos luminosos, linhas em zig-zag, pontos escuros. Podem ocorre outros tipos de aura, como as auras motoras (perda de força) ou sensitivas (formigamento ou perda da sensibilidade) geralmente em um braço, perna, face ou todo lado do corpo. A duração da aura e geralmente de 5 a 60 minutos, mas pode ser prolongada (mais que 60 minutos) ou curta (menos que 5 minutos). Auras ocorrem em cerca de 15% dos pacientes com enxaqueca, e são estes diagnosticados como enxaqueca com aura.
  • A fase da cefaléia é certamente, de todos sintomas da enxaqueca, a que mais incapacita o sofredor de enxaqueca. A crise típica de enxaqueca apresenta a característica dor pulsátil (latejante), localização em apenas um lado da cabeça (unilateral), piora da dor com esforço físico, dura de 4 a 72 horas. Apresenta náusea, vômitos, sensibilidade a luz, sons e cheiros associados a dor. A intensidade da dor é moderada para forte, e a crise causa grande impacto na vida do paciente, com perda da capacidade para atividades habituais.  
  • A fase posterior à cefaléia, a fase de resolução ou posdrômica é caracterizada por intolerância a alimentos, cansaço, dificuldade em concentração, e dolorimento muscular, esta fase é pouco estudada no campo da cefaléia, mas acredita-se que ela resulta da recuperação do organismo posterior a dor de cabeça.

ATENÇÂO! NÃO SE AUTO MEDIQUE!

TRATAMENTOS

O tratamento das cefaleias, particularmente o tratamento da enxaqueca em geral é dividido em dois tipos: o tratamento agudo (para aliviar a crise de dor de cabeça) e o tratamento preventivo (para evitar o aparecimento das cefaleias). Tanto o tratamento agudo quanto o preventivo pode envolver remédios (medicamentoso / farmacológico) ou não (não medicamentoso / farmacológico).


TRATAMENTO AGUDO
A meta do tratamento agudo para crise de dor de cabeça, enxaqueca é promover o alívio da dor o mais rápido possível, sem efeitos colaterais. Outras questões importantes no tratamento da crise de cefaleia é a comodidade da via de administração do remédio (sublingual, via retal, via oral, injetável), a taxa de recorrência (retorno da dor de cabeça em 24 horas), e o custo do tratamento. No entanto, não há nenhuma medicação perfeita. Alívio imediato pode não acontecer, efeitos colaterais podem ocorrer, por vezes é necessário o uso de medicações injetáveis, a dor de cabeça pode voltar no dia seguinte, e o custo dos remédios pode ser alto. Por isso, pacientes e médicos devem se preparar para escolher qual a melhor estratégia para o tratamento da crise de dor de cabeça.

TRATAMENTO AGUDO NÃO MEDICAMENTOSO
Além dos remédios, algumas outras estratégias podem ser usadas para o alívio mais efetivo da crise de dor de cabeça. A aplicação de uma compressa fria, ou gelo na região cervical e/ou frontal pode ajudar no alívio da dor. Pessoas com intensa ansiedade na hora da crise, acabam entrando em desespero, chorando, hiperventilando (respirando aceleradamente), o que causa piora dos sintomas da crise de cefaléia. Para tais condições, o treinamento de técnicas de relaxamento pode reduzir e até abolir um número considerável de crises, porém, é preciso um esforço pessoal do paciente maior.

TRATAMENTO PREVENTIVO                                  
O tratamento preventivo para cefaleias é o principal tratamento das dores de cabeça, o tratamento preventivo, também conhecido como tratamento profilático, visa evitar as crises, torná-las menos intensas, menos freqüentes, e mais responsivas ao tratamento agudo.        Expectativas realistas para o tratamento são necessárias, redução das crises em 50% acontecem na maioria dos casos.
Atenção! Não se auto medique! Procure um médico para realizar um correto diagnóstico e tratamento.

As enxaquecas e a alimentação

Cada vez existem mais estudos que relacionam a ocorrência de enxaquecas (dores de cabeça) com a alimentação. Alguns alimentos podem provocar dores de cabeça enquanto outros podem prevenir ou mesmo tratá-las.
Por exemplo, por vezes o café pode fazer parar uma dor de cabeça e alimentos ricos em magnésio, cálcio, hidratos de carbono complexos e fibras têm sido usados para curar enxaquecas. Alguns estudos indicam que o gengibre – a especiaria que comummente usamos na culinária – pode ajudar a prevenir e a tratar enxaquecas, com a vantagem de não ter os efeitos secundários dos medicamentos químicos. A matricária é também um excelente remédio natural para as enxaquecas.
Uma enxaqueca não é simplesmente uma enorme dor de cabeça. Tem um padrão característico, geralmente envolvendo só um dos lados da cabeça. É uma dor latejante forte, diferente de uma dor branda e constante, muitas vezes acompanhada de náuseas, vómitos e sensibilidade à luz e aos sons.
De qualquer forma, se as dores de cabeça fortes são uma novidade para si, o melhor será mesmo consultar um médico.
Diversos estudos têm vindo a demonstrar a eficácia de dietas - apropriadas na redução e tratamento de enxaquecas, em crianças, adolescentes e adultos.
Alimentos à prova de dor
Os alimentos à prova de dor praticamente nunca contribuem para dores de cabeça ou outras condições dolorosas. Estes incluem:
- Arroz, principalmente integral.
- Vegetais de cor verde cozinhados, tais como brócolos, espinafres, repolho ou acelga.
- Vegetais cor-de-laranja cozinhados, tais como cenouras ou batata doce.
- Vegetais de cor amarela cozinhados, tais como abóbora.
- Frutos não ácidos cozinhados ou secos: cerejas, arandos, pêras, ameixas (mas não frutas ácidas, tais como maçãs, bananas, pêssegos ou tomates).
- Água: água simples ou em formas carbonadas são boas. Outras bebidas - mesmo infusões de ervas – podem provocar uma enxaqueca.
Condimentos: quantidades moderadas de sal, xarope de ácer, e extracto de baunilha são geralmente bem tolerados.


O que normalmente provoca uma enxaqueca
Há coisas que muitas vezes provocam enxaquecas em pessoas mais sensíveis. Tal como a sensibilidade a alimentos se pode manifestar por comichão na pele, as pessoas que sofrem de enxaquecas têm reacções ao nível dos vasos sanguíneos e nervos. De seguida, apresentamos uma lista dos 12 alimentos que mais comummente provocam acessos de dores de cabeça nas pessoas sensíveis, por ordem de importância:
- Lacticínios (inclui leite de vaca magro ou gordo, leite de cabra, queijo, iogurte, etc);
- Chocolate;
- Ovos;
- Frutas ácidas;
- Carne (inclui carne de vaca, porco, galinha, peru, peixe, etc)
- Trigo (pão, massas, etc);
- Frutos de casca rija ou amendoins;
- Tomates;
- Cebolas;
- Milho;
- Maçãs;
- Bananas.

Algumas bebidas ou aditivos também estão entre os piores a provocar dores de cabeça, incluindo bebidas alcoólicas (especialmente vinho tinto), bebidas com cafeína (café, chás e colas), glutamato monosódico, aspartame e nitritos.
Outros alimentos que não constam desta lista também podem provocar acessos de enxaquecas; por isso não estão completamente acima de qualquer suspeita, embora sejam menos prováveis.


Confirme os alimentos que provocam enxaquecas
Se as mudanças da sua dieta alimentar ajudaram a melhorar ou diminuir a frequência das suas dores de cabeça, o passo seguinte é confirmar quais os alimentos que as provocavam. Para fazer isto, basta introduzir, um de cada vez, os alimentos que tinham sido eliminados, de dois em dois dias, para ver se surgem as dores de cabeça outra vez.
Comece pelo último da lista e vá subindo até aos alimentos mais arriscados, podendo saltar aqueles pelos quais não se interessa. Se desejar, pode depois passar às bebidas e aditivos referidos.
Quando fizer isto, tenha quantidades generosas de cada alimento que vai reintroduzir, para ter a certeza de que lhe causa sintomas. Se não sentir diferenças, pode mantê-lo na sua dieta. Qualquer coisa que lhe provoque uma dor de cabeça deve ser eliminado outra vez. Depois, passada uma semana mais ou menos, experimente o alimento de que suspeita novamente, para confirmação. Mantenha a sua dieta simples, para detectar facilmente o efeito de cada novo alimento.
A carne (e peixe), lacticínios, e ovos devem ser deixados fora do seu prato permanentemente. Para além de serem os piores alimentos a desencadear acessos de dores de cabeça, também perturbam o seu equilíbrio hormonal natural, o que contribui para as enxaquecas.
O colesterol que contêm, as gorduras e as proteínas de origem animal estão ligados a problemas graves de saúde incluindo doenças cardiovasculares (coração), tensão arterial alta, osteoporose e cancros da mama, próstata e cólon, por isso não precisa de trazer esses alimentos que só lhe causam problemas de volta ao seu prato.


Procurar outros alimentos fora da lista
Se, passadas duas semanas de alteração na sua dieta, não notar nenhuma redução nas suas dores de cabeça, o passo seguinte será o de procurar outros alimentos que não estejam na lista dos piores doze e que lhe possam estar a provocar os sintomas. Isto acontece de vez em quando e, de facto, há pessoas que são sensíveis a vários tipos de alimentos.
Aqui estão algumas dicas para o ajudar a identificar os culpados:
- Os alimentos que lhe causaram um acesso de dores de cabeça foram comidos geralmente 3 a 6 horas antes.
- Os alimentos que causam dores de cabeça podem ser aqueles de que mais gosta ou pelos quais costuma ter apetites. Podem ser os de que menos suspeita.
- Às vezes a dor de cabeça só surge depois de se ingerir uma grande quantidade do alimento culpado, talvez após ingeri-lo durante vários dias.
- Se for afectado por vários alimentos, o facto de eliminar só um pode não fazer nenhuma diferença. Isto às vezes leva as pessoas a achar que os alimentos não são o problema.
- Pode descobrir que talvez possa comer uma quantidade pequena do alimento culpado sem isso lhe provocar sintomas e só uma grande quantidade ingerida lhe venha a causar dores de cabeça.
- A sua tolerância pode variar em diferentes alturas. Por exemplo, uma mulher pode normalmente ser capaz de comer uma caixa de chocolates sem problemas mas, à medida em que se aproxima do período menstrual, um simples quadrado de chocolate desencadeia uma enxaqueca. A razão, presumivelmente, está no facto de as mudanças hormonais que ocorrem naturalmente ao longo do mês afectarem a sua sensibilidade.
- As causas das enxaquecas podem mudar ao longo do tempo.
- O seu médico pode pedir-lhe análises clínicas especiais para detectar a sua sensibilidade a alimentos. Podem ser bastante caros mas são mais rápidos a detectar o que lhe causa as enxaquecas. De mencionar que os testes de sensibilidade de pele não servem para detectar o que lhe causa dores de cabeça.


Num acesso de dores de cabeça
- Apesar da cafeína poder provocar enxaquecas, nalguns casos pode também funcionar como tratamento. A dose é uma a duas chávenas de café aos primeiros sinais de dor de cabeça.
- Coma alimentos ricos em amido, como o arroz, batatas, crackers ou pão. Sim, os alimentos ricos em trigo podem provocar enxaquecas em algumas pessoas, mas se o seu organismo o tolerar, podem ajudar. Algumas pessoas inclusivamente sentem necessidade de comer alimentos ricos em amido quando têm dores de cabeça e comer tostas, crackers, massas, batatas e outros alimentos ricos em amidos reduz as suas dores de cabeça ou náuseas e pode mesmo diminuir a duração dos sintomas. Guie-se pela sua experiência para saber se isto funciona consigo.
- Gengibre fresco em pó, 500 a 600 miligramas (cerca de ¼ de colher de chá), num copo de água pode ajudar. Repita, se necessário, durante várias horas, até um máximo de 2 gramas por dia.
- O cálcio pode ajudar a tratar ou prevenir enxaquecas. No entanto, evite a tentação de ir buscar o cálcio aos lacticínios (leite, iogurte) ou outra fonte de origem animal. Estes causam mais prejuízos que benefícios.
- Deite-se num sítio sossegado e escuro e durma, se puder. Use compressas frias ou quentes e massage os vasos sanguíneos das têmporas (lado da testa, a cerca de dois dedos dos olhos)
- A acupunctura e outros tratamentos naturais também se mostraram úteis para algumas pessoas.